Você já ouviu falar de déficit de atenção em adultos? Vários médicos também não. Mas saiba que ele pode estar no olho do furacão que transforma a vida conjugal de muita gente em um caos.
Seu marido vive no mundo da lua e não presta atenção no que você diz? Ele se distrai com facilidade e precisa de ajuda para se organizar? Sua mulher mexe pés ou mãos sem parar? Está sempre atrasada e se esquece com frequência de pagar contas da casa ou de buscar as crianças na escola? Calma, antes de começar mais uma briga de casal, considere a possibilidade de procurar a ajuda de um especialista em um distúrbio chamado transtorno do déficit de atenção com hiperatividade, ou TDAH — sim, aquela doença considerada exclusivamente de crianças até pouco tempo atrás. É que seu companheiro ou companheira pode sofrer desse mal.
Por longos anos, a americana Melissa Orlov sentiu na pele o drama de conviver com um portador de TDAH sem saber, mesmo trabalhando diretamente com psiquiatras da Universidade Harvard especializados em défi cit de atenção e hiperatividade. E só conseguiu dar uma guinada em seu casamento depois de reconhecer o problema do marido — e tratá-lo. “Saímos de um relacionamento verdadeiramente miserável para alcançarmos uma vida bem mais feliz”, conta a SAÚDE! a hoje consultora de casamentos. A experiência permitiu a Melissa escrever o livro The A.D.H.D. Effect on Marriage (em tradução livre, Efeitos do TDAH no Casamento), que acaba de ser publicado nos Estados Unidos.
Em seu trabalho, sem previsão de lançamento em português, a autora compara o cônjuge com défi cit de atenção a uma criança que precisa de ajuda para quase tudo. Ela relata que a distração, a desatenção e a desorganização são motivos de conflitos permanentes na vida a dois. “Essa inconstância frequente do parceiro faz com que os casais que convivem com a doença tenham um risco dobrado de se separar”, constata Melissa. Segundo a psiquiatra Gabriela Dias, pesquisadora do Grupo de Déficit de Atenção (Geda) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, há uma distribuição desigual de tarefas e responsabilidades na família. “Além da sobrecarga, o parceiro de um portador de TDAH se sente ressentido, rejeitado e ignorado porque todos confundem déficit de atenção com desleixo, preguiça e desinteresse”, explica Gabriela.
O TDAH é mais comum nos homens, embora tenha maior impacto em mulheres. Estima-se que o distúrbio atinja cerca de 5% de crianças e jovens, dos quais metade permanece com a doença e seus sintomas ao se tornar adulto. No Brasil, isso significa quase 3 milhões de pessoas. O psiquiatra Luis Agusto Rohde, diretor do Programa de Déficit de Atenção e Hiperatividade no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, ensina que os sinais da doença mudam com o passar do tempo. “A hiperatividade cai, mas a dificuldade de concentração persiste. Além disso, adiar compromisso e nunca se planejar se torna uma rotina na vida do portador de TDAH, que também sofre com sua impulsividade: ele age antes de pensar”, diz Rohde.
Na prática, o parceiro ou a parceira com o déficit de atenção se torna mais uma criança da família, eliminando todo o romantismo da relação. A outra metade do casal, a sem a doença, tem de se lembrar de cada compromisso, assumir as contas da casa, organizar documentos importantes, responsabilizar- se pelos filhos, tomar cuidados extras para que nada se perca ou quebre e, ainda, ouvir aqueles irritantes “Hãs?” no meio de cada conversa. “Isso quando o companheiro não perde o emprego por sua instabilidade ou envolve-se com drogas para suprir a baixa autoestima”, reforça a psiquiatra Gabriela Dias. “Outro problema comum, que pode levar a uma gravidez indesejada: o homem se esquece de usar camisinha ou a mulher deixa de tomar pílula.”
O principal problema do déficit de atenção não é o distúrbio em si, mas a falta de diagnóstico. O parceiro saudável tende a responsabilizar o outro pelos constantes conflitos sem se dar conta de que ele não se esquece das coisas porque quer. É diferente, por exemplo, do marido que deixa a toalha molhada em cima da cama habitualmente. No caso do homem com TDAH, mesmo que quisesse mudar sua conduta, por pura desatenção, continuaria deixando a peça encharcada sobre o lençol. “É tentador jogar a culpa no outro, mas isso só agrava o problema, deixando o marido ou a mulher cada vez mais na defensiva e fazendo com que a irritação crônica torne-se a marca do casal”, alerta Melissa Orlov.
Além dos problemas no casamento, existem outros aspectos da vida de um portador de TDAH que podem indicar a presença do déficit. Pisadas na bola no trabalho e vaciladas nos estudos costumam reforçar a suspeita. O caos na organização e a incapacidade de concluir até a arrumação de uma gaveta também representam sinais importantes de que algo não vai bem, assim como estresse constante, preocupações excessivas, frustrações e culpa. Em outras palavras, é difícil conviver com tudo isso sem ter consciência de que algo fora do comum está acontecendo.
A medicina desconhece as causas do distúrbio e por isso não há cura para ele. Mas hoje é possível controlar os sintomas do TDAH com relativo sucesso. Os médicos explicam que o tratamento se baseia em medicação e psicoterapia. O remédio devolve a atenção ao paciente e baixa sua inquietude, enquanto a chamada terapia cognitivocomportamental ensina a ele técnicas para aprender a lidar com os sintomas. “Com a terapia, a pessoa pode aprender a se planejar com ferramentas organizacionais, como calendários, agendas eletrônicas, programas de computador, PDAs e registros de compromissos”, informa Luis Augusto Rohde.
Apesar da eficácia do tratamento do TDAH, muita gente deixa de recebê-lo por falta de diagnóstico, assim como crianças ainda tomam remédio por serem um pouco mais agitadas do que os colegas. Tudo isso se deve à falta de informação não só da classe médica mas também de pais e educadores. “No caso das crianças, há profissionais que confundem agitação com hiperatividade. É diferente, existem protocolos claros para o diagnóstico”, alerta a psiquiatra Gabriela Dias. “Já no caso dos adultos, o problema é que muitos médicos ainda acham que déficit de atenção é uma doença infantil e desconsideram essa possibilidade ao avaliar um paciente. Além disso, o TDAH pode ocorrer junto com outros transtornos, como depressão e ansiedade.”
O tratamento do déficit de atenção tende a mudar o relacionamento do casal da água para o vinho. O parceiro com o distúrbio torna-se mais participativo. Lembrar-se de comprar o pão na volta do trabalho deixa de ser um martírio. Prestar atenção no que o outro está dizendo também. Começar e terminar de arrumar a mesa do jantar vira uma rotina. As frustrações deixam de ser um bicho de sete cabeças e as palavras já não saem com a mesma impulsividade da boca. Enfim, marido e mulher resgatam uma harmonia que parecia perdida para sempre. “Não é um caminho fácil, é preciso muita conversa para esclarecer anos de raiva e ressentimento. Mas acho que o final tem tudo para ser feliz”, diz Melissa Orlov.
Por longos anos, a americana Melissa Orlov sentiu na pele o drama de conviver com um portador de TDAH sem saber, mesmo trabalhando diretamente com psiquiatras da Universidade Harvard especializados em défi cit de atenção e hiperatividade. E só conseguiu dar uma guinada em seu casamento depois de reconhecer o problema do marido — e tratá-lo. “Saímos de um relacionamento verdadeiramente miserável para alcançarmos uma vida bem mais feliz”, conta a SAÚDE! a hoje consultora de casamentos. A experiência permitiu a Melissa escrever o livro The A.D.H.D. Effect on Marriage (em tradução livre, Efeitos do TDAH no Casamento), que acaba de ser publicado nos Estados Unidos.
Em seu trabalho, sem previsão de lançamento em português, a autora compara o cônjuge com défi cit de atenção a uma criança que precisa de ajuda para quase tudo. Ela relata que a distração, a desatenção e a desorganização são motivos de conflitos permanentes na vida a dois. “Essa inconstância frequente do parceiro faz com que os casais que convivem com a doença tenham um risco dobrado de se separar”, constata Melissa. Segundo a psiquiatra Gabriela Dias, pesquisadora do Grupo de Déficit de Atenção (Geda) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, há uma distribuição desigual de tarefas e responsabilidades na família. “Além da sobrecarga, o parceiro de um portador de TDAH se sente ressentido, rejeitado e ignorado porque todos confundem déficit de atenção com desleixo, preguiça e desinteresse”, explica Gabriela.
O TDAH é mais comum nos homens, embora tenha maior impacto em mulheres. Estima-se que o distúrbio atinja cerca de 5% de crianças e jovens, dos quais metade permanece com a doença e seus sintomas ao se tornar adulto. No Brasil, isso significa quase 3 milhões de pessoas. O psiquiatra Luis Agusto Rohde, diretor do Programa de Déficit de Atenção e Hiperatividade no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, ensina que os sinais da doença mudam com o passar do tempo. “A hiperatividade cai, mas a dificuldade de concentração persiste. Além disso, adiar compromisso e nunca se planejar se torna uma rotina na vida do portador de TDAH, que também sofre com sua impulsividade: ele age antes de pensar”, diz Rohde.
Na prática, o parceiro ou a parceira com o déficit de atenção se torna mais uma criança da família, eliminando todo o romantismo da relação. A outra metade do casal, a sem a doença, tem de se lembrar de cada compromisso, assumir as contas da casa, organizar documentos importantes, responsabilizar- se pelos filhos, tomar cuidados extras para que nada se perca ou quebre e, ainda, ouvir aqueles irritantes “Hãs?” no meio de cada conversa. “Isso quando o companheiro não perde o emprego por sua instabilidade ou envolve-se com drogas para suprir a baixa autoestima”, reforça a psiquiatra Gabriela Dias. “Outro problema comum, que pode levar a uma gravidez indesejada: o homem se esquece de usar camisinha ou a mulher deixa de tomar pílula.”
O principal problema do déficit de atenção não é o distúrbio em si, mas a falta de diagnóstico. O parceiro saudável tende a responsabilizar o outro pelos constantes conflitos sem se dar conta de que ele não se esquece das coisas porque quer. É diferente, por exemplo, do marido que deixa a toalha molhada em cima da cama habitualmente. No caso do homem com TDAH, mesmo que quisesse mudar sua conduta, por pura desatenção, continuaria deixando a peça encharcada sobre o lençol. “É tentador jogar a culpa no outro, mas isso só agrava o problema, deixando o marido ou a mulher cada vez mais na defensiva e fazendo com que a irritação crônica torne-se a marca do casal”, alerta Melissa Orlov.
Além dos problemas no casamento, existem outros aspectos da vida de um portador de TDAH que podem indicar a presença do déficit. Pisadas na bola no trabalho e vaciladas nos estudos costumam reforçar a suspeita. O caos na organização e a incapacidade de concluir até a arrumação de uma gaveta também representam sinais importantes de que algo não vai bem, assim como estresse constante, preocupações excessivas, frustrações e culpa. Em outras palavras, é difícil conviver com tudo isso sem ter consciência de que algo fora do comum está acontecendo.
A medicina desconhece as causas do distúrbio e por isso não há cura para ele. Mas hoje é possível controlar os sintomas do TDAH com relativo sucesso. Os médicos explicam que o tratamento se baseia em medicação e psicoterapia. O remédio devolve a atenção ao paciente e baixa sua inquietude, enquanto a chamada terapia cognitivocomportamental ensina a ele técnicas para aprender a lidar com os sintomas. “Com a terapia, a pessoa pode aprender a se planejar com ferramentas organizacionais, como calendários, agendas eletrônicas, programas de computador, PDAs e registros de compromissos”, informa Luis Augusto Rohde.
Apesar da eficácia do tratamento do TDAH, muita gente deixa de recebê-lo por falta de diagnóstico, assim como crianças ainda tomam remédio por serem um pouco mais agitadas do que os colegas. Tudo isso se deve à falta de informação não só da classe médica mas também de pais e educadores. “No caso das crianças, há profissionais que confundem agitação com hiperatividade. É diferente, existem protocolos claros para o diagnóstico”, alerta a psiquiatra Gabriela Dias. “Já no caso dos adultos, o problema é que muitos médicos ainda acham que déficit de atenção é uma doença infantil e desconsideram essa possibilidade ao avaliar um paciente. Além disso, o TDAH pode ocorrer junto com outros transtornos, como depressão e ansiedade.”
O tratamento do déficit de atenção tende a mudar o relacionamento do casal da água para o vinho. O parceiro com o distúrbio torna-se mais participativo. Lembrar-se de comprar o pão na volta do trabalho deixa de ser um martírio. Prestar atenção no que o outro está dizendo também. Começar e terminar de arrumar a mesa do jantar vira uma rotina. As frustrações deixam de ser um bicho de sete cabeças e as palavras já não saem com a mesma impulsividade da boca. Enfim, marido e mulher resgatam uma harmonia que parecia perdida para sempre. “Não é um caminho fácil, é preciso muita conversa para esclarecer anos de raiva e ressentimento. Mas acho que o final tem tudo para ser feliz”, diz Melissa Orlov.
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